Ficar trancado dentro de casa, perder as chaves, a porta do carro que não abre e até corpos de mortos que ficam trancados na agência funerária. Conheça a história e as histórias do “Abel das chaves”, de S. João da Madeira.
Um rádio a tocar, que não esconde os sinais do tempo. Na parede vários calendários. Um relógio. E centenas de chaves e milhares de objetos que, para muitos, podem ser considerados “lixo”. Abel Silva, 78 anos, saiu da escola com cerca de 11. Natural de Vale de Cambra, conheceu várias profissões, antes de chegar a chaveiro, profissão que “herdou do seu avô”.
Trabalhou nas terras com a mãe, mais tarde foi ajudante de carpinteiro, ajudou o pai na relojoaria. Não se sentia realizado e foi para ajudante de pedreiro até aos 16 anos, numa altura em que o ordenado era pago à semana.
A profissão que hoje tem nasceu nos anos 60 na vida de “Abel das Chaves” como é conhecido. “O meu avô teve uma ourivesaria, muito antes de eu ter nascido, e contava que foi assaltado com uma chave falsa e, por isso, criou uma fechadura para impedir situações destas. Era um ‘inventor de segredos’ e criou uma fechadura com códigos, na altura ainda de letras, só mais tarde vieram os números personalizados, em janeiro de 1932”, conta.
Esta invenção do avô passou mais tarde a “domínio público”, e acabou por ser patenteada e comercializada em várias empresas.
Pode dizer-se que foi graças a essa fechadura que começou a sua carreira enquanto chaveiro. “Foi uma paixão” e ainda se mantém. “Sempre achei interessante poder abrir fechaduras, e até carros, sem usar chaves”, partilha.
Há 40 anos quem já trabalhava nesta profissão dizia que havia crise, já era mal paga. Foi tudo isso que o fez deixar de trabalhar para os outros e ser patrão dele mesmo. Sempre com regras e nada de baldas ao trabalho.
O certo é que a entrevista foi interrompida várias vezes. Um cliente com a porta da viatura que não abre, outro para fazer uma chave, com um segredo especial, e outros de serviço mais rápido como a criação de uma simples chave. A juntar a tudo isto: o telemóvel sempre a tocar.
“Tenho clientes de todo o lado. Nunca fiz publicidade. Vêm cá todos parar. É porque gostam do meu trabalho”, assegura.
Abel conhece as chaves como ninguém. “Tem algumas marcas de carros que a chave dá muitos problemas. E como eu já sei o que é, nos tempos livres, vou fazendo as peças para substituição. Assim, o cliente quando chegar, eu vou ali, espera dois minutos, e sai todo contente”, informa.
Abel tem a consciência que, nos últimos anos, o mercado mudou bastante, de forma que surgiram novas tecnologias. “É natural, o mundo está a evoluir. Aquilo que sei é que estas novas viaturas dão cada vez mais problemas do que os carros antigos. Começando por aqueles que não têm chave”, remata.
Poderá ter acesso à versão integral deste artigo na edição impressa de 5 de janeiro ou no formato digital, subscrevendo a assinatura em https://oregional.pt/assinaturas/