Sociedade

Hortalices - As hortas da minha infância

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A horta era uma creche do despertar para o mundo, uma pré-primária do conhecimento da natureza, um centro da aprendizagem da vida e da responsabilidade.

No campo era diferente. Nas cidades talvez já houvesse creches, infantários e amas. As mães iam trabalhar para a fábrica ou para o escritório e os filhos eram entregues à guarda dessas instituições.
Nas aldeias, não era assim. As crianças encontravam-se totalmente integradas e dependentes da família. Muitas vezes, nem as avós podiam servir de recurso à guarda das crianças, porque elas próprias também trabalhavam no campo.
Antes de entrarem na escola primária, e logo que tivessem condição para suportar os calores do estio e as friagens do inverno, as crianças acompanhavam a família para todo o lado. Nos primeiros tempos, as mães transportavam os berços para as hortas, colocavam-nos debaixo de uma árvore ou noutro local abrigado e iam fazendo o seu trabalho, sempre atentas ao estado dos filhotes. Quando havia sinais de fome, o refeitório estava perto…
À medida que os anos iam passando, as crianças iam crescendo e aprendendo nas hortas e com as hortas. A imaginação infantil não tem limites, por isso não era difícil inventar brincadeiras: casinhas de pedra, pequenas barragens nos regos da água, moinhos de vento com as “camisas” do milho, baloiços nas árvores, descoberta e vigilância dos ninhos da passarada, captura de grilos, banhocas na ribeira… Cada horta tinha o seu encanto próprio: numas havia uma nascente, noutras uma árvore especial, noutras uma cabana de colmo, outras ficavam ao lado da ribeira, havia que aproveitar as condições do lugar.
A horta era uma creche do despertar para o mundo, uma pré-primária do conhecimento da natureza, um centro da aprendizagem da vida e da responsabilidade.
Não pretendo dar desse tempo imagens simplistas e, tantas vezes, contraditórias. Recordar o passado é uma forma de lembrar que o mundo nem sempre foi como é agora: as amnésias coletivas nunca deram bom resultado. Foi isso que me motivou a escrever. Por isso, no próximo dia 21 de outubro, pelas 15h, estarei na Biblioteca Municipal com os meus amigos Margarida Negrais, Daniel Neto e Minda Araújo e as “Mulheres da eira”, para vos apresentar um livrinho que fala de hortas e de muito mais: “As três escolas da minha aldeia”, assim se chama. Se tiverdes a curiosidade e a paciência de me acompanhar, sereis bem vindos.

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