São histórias de vida amargas, de pessoas que escaparam à morte e tiveram que aprender a viver de novo. Fomos conhecer relatos de sanjoanenses que estiveram em coma e, apesar de algumas “sequelas”, dizem que a sorte esteve ao lado deles.
Há quem não queira falar do assunto. Outros revelam a sua história, mas pedem anonimato. Uns, apesar de algumas sequelas, garantem que, afinal, nem tudo foi assim tão mau.
Dário Madeira é natural de S. João da Madeira e pode mesmo dizer-se que a sua vida foi tudo menos fácil. Perdeu o pai, com apenas nove anos e, desde cedo, teve de trabalhar para ajudar a mãe e a irmã. Aos 18 anos começou a trabalhar como vendedor, uma vida que diz ser muito stressante, com tabaco e café à mistura, que despoletou um AVC, quando tinha 34 anos. Um acidente vascular cerebral que o deixou em coma em 2009. “Estive num mundo à parte. Abria os olhos pontualmente e não via nada. Acho que viajei durante esse tempo por memórias boas e más da minha vida”. Apesar do tempo, Dário tem ainda muito presente o acordar do coma. “Queria saber tudo. Perguntei de imediato o que é que me tinha acontecido. Estava irrequieto. O contacto com a água no corpo despertou em mim uma reação estranha, e levou-me ao tempo em que eu era pequeno”.
Passou pelos cuidados intensivos, cuidados intermédios, foi submetido a uma cirurgia à cabeça, deixou de falar, de andar. Tudo isto durante seis meses de internamento no Hospital Santo António, no Porto. Andou de cadeira de rodas, fez fisioterapia assídua, hoje já caminha sem grande dificuldade, conduz uma viatura de mudanças automáticas.
Aos 45 anos, este sanjoanense já não pensa muito no passado, apesar do AVC lhe ter deixado algumas marcas. Durante a nossa conversa, nunca escondeu o sorriso, que aumentava quando falava da mulher e da filha Francisca, dois “pilares fundamentais” na sua vida.
Além do lado direito do corpo não responder da mesma forma, adaptou-se a conviver com isso.
Depois da doença, em 2016, apresentou uma candidatura à Associação Salvador para criar o seu negócio, que foi aprovada, e, hoje, é uma realidade na cidade. Mas não é um negócio qualquer. “Criei a minha própria marca de calçado «Shoes for a Cause», que se destina a mulheres sobreviventes de AVC”, rematou.
Artigo disponível, em versão integral, na edição nº 3853 de O Regional, publicada em 22 de julho de 2021.