À semelhança do que o jornal “O Arrifanense” fazia no passado, uma das atividades de destaque da freguesia dizia respeito às Invasões Francesas de 17 de abril de 1809.
Quem o diz é o presidente da Junta de Freguesia de Arrifana, Ricardo Oliveira, em entrevista ao jornal “O Regional”. Mais uma vez, este acontecimento foi assinalado ao longo de alguns dias, culminando com a data que lhe atribuiu significado: 17 de abril passado.
Numa altura em que a imigração tem crescido substancialmente, o autarca arrifanense referiu que é cada vez mais importante transmitir a cultura e os factos históricos que marcaram a povoação de Arrifana. “Por outro lado, queremos que as crianças e os jovens arrifanenses tenham presente que vivem numa terra rica em história que, apesar de trágica para a população, moldou o espírito bairrista que caracteriza este povo”, acrescentou Ricardo Oliveira, em declarações ao “O Regional”.
Este espetáculo de grande formato das Invasões Francesas, uma espécie de recriação do que aconteceu a 17 de abril de 1809, é uma manifestação cultural com cariz histórico. Entre os passados dias 12 e 17 de abril, a freguesia de Arrifana evocou os 215 anos das Invasões Francesas e o Massacre de Arrifana, uma data trágica que perdura na memória dos arrifanenses. “[esta manifestação] Pretende manter viva a memória daqueles que sacrificaram a sua vida por Arrifana”, enfatizou o atual autarca de Arrifana.
Passados 215 anos, será que o povo de Arrifana continua a dar valor a esta data histórica? “É impossível o povo de Arrifana esquecer os seus antepassados que sofreram e morreram nas mãos dos invasores”, considerou Ricardo Oliveira, destacando que “não é por mero acaso” que o elemento central existente no brasão da vila de Arrifana é o Monumento aos Mártires das Invasões Francesas, inaugurado a 17 de abril de 1914.
Para além deste monumento, os populares cuidam, ainda, das ‘Alminhas e do Retábulo’ existentes perto do Largo da Guerra Peninsular, erguidas em memória aos mártires. Aquando do bicentenário das Invasões Francesas, uma placa memorial foi também colocada na Avenida da Buciqueira com os nomes de todos os mártires. Neste local, foram mortos mais de 60 arrifanenses. “Como tal, o valor emocional é bastante pesado na memória dos arrifanenses”, garantiu o presidente da junta.
A importância de preservar um passado trágico
Segundo o autarca arrifanense, não se prevê a construção física de outros memoriais, mas sim a preservação dos existentes, à semelhança do que aconteceu no ano passado com as obras de conservação no Monumento da Guerra Peninsular e nas Alminhas.
Para 2025, já há outros planos. “Prevemos requalificar a placa memorial situada na Avenida da Buciqueira, dado que as letras já estão impercetíveis. Pretendemos divulgar a história nas escolas através da distribuição do livro «Turbilhão no passado», da autoria da professora Ana Paula Oliveira”, enumerou Ricardo Oliveira, afirmando: “A maior obra que podemos ter é manter viva a memória deste episódio trágico para Arrifana, quer na vertente solene, quer na vertente cultural e histórica.”
Os testemunhos dos mártires arrifanenses
Apesar da vertente trágica que marcou os acontecimentos do dia 17 de abril de 1809, o presidente da Junta de Freguesia de Arrifana acredita piamente que o espírito bairrista dos habitantes de Arrifana existe e mantém-se por causa do que aconteceu. “Se pensarmos bem, são mais de 200 anos, mas em termos históricos não é muito tempo; foram poucas gerações atrás. E o facto de muitos terem sobrevivido manteve o testemunho vivo durante muitos anos”, enalteceu.
Por outro lado, Ricardo Oliveira também acredita que, numa altura em que Arrifana era uma aldeia com poucas centenas de habitantes e tendo a maioria das habitações sido saqueada e incendiada, “a imagem de terror deve ter perdurado longos anos” na mente da população. “Só com uma força revigorante é que foi possível «renascer das cinzas» e tornar Arrifana uma terra próspera”, declarou, convicto.
A ‘evolução’ das Invasões Francesas…
O espetáculo das Invasões Francesas já é recriado há vários anos, mas nem sempre foi assim. “Se hoje existe uma maior aposta no evento por parte do município de Santa Maria da Feira, foi graças a todo trabalho a montante. Relembro que em 2009, pelos 200 anos das Invasões Francesas em Arrifana, viveram-se dias grandiosos. Mas, nos anos seguintes, as evocações não passavam de uma cerimónia religiosa e romagem ao monumento”, contou Ricardo Oliveira.
Em 2015, apostaram na prata da casa, com associações e voluntários integrantes do Grupo de Milícias. Começaram a criar envolvência com encenações e iniciaram a Feira Peninsular. “Envolvemos associações e escolas nos apontamentos cénicos como forma de transmitir aos mais novos a nossa história. Nos anos seguintes fomos evoluindo com o apoio do município, até este ter sido reconhecido pela Associação do Turismo Militar Português”, recordou o autarca.
Durante a pandemia, Ricardo Oliveira disse que aproveitaram o facto de não haver atividades no exterior para realizar um documentário “muito bem conseguido” pelo encenador Carlos Reis. “É um registo importante para alimentar a curiosidade dos mais novos”, opinou o presidente. “É um caminho de crescimento sustentável que temos vindo a traçar com vista a manter as Invasões Francesas como uma atividade cultural anual na programação do município, geradora de valor e duradoura”, descreveu.
… até à atualidade
O espetáculo de grande formato alusivo às Invasões Francesas diferiu dos anos anteriores, uma vez que o público não teve que se deslocar ao longo dos atos cénicos. Desta forma, a população assistiu comodamente ao espetáculo, que consistiu em todo o cenário necessário para contar a história desde a entrada dos franceses no Porto até ao massacre na Buciqueira. De forma simples, percetível a todo o tipo de público, as recriações das Invasões Francesas despertaram “muito sentimento e espetacularidade”.
Em todo o caso, qual foi a mensagem que este espetáculo de grande formato quis passar à comunidade? “Desde logo, a mensagem de que, apesar da destruição em 1809 nesta pacata povoação, os que ficaram arregaçaram as mangas e tornaram a aldeia numa terra próspera, com um sentimento de pertença maior, como forma de homenagem aos que sucumbiram nas mãos dos franceses”, sublinhou Ricardo Oliveira. “É esse o espírito que queremos incutir aos mais novos. Apesar das dificuldades do dia-a-dia, nada se compara com uma tragédia destas. Devemos ser resilientes, persistentes e demonstrar que, com paixão, conseguimos elevar ainda mais o nome da nossa vila”, refletiu o presidente.