Há educadores fora de série!...
Quando eu frequentava a Escola Superior da Educação no Porto, conhecia muito bem o fundador da Casa do Gaiato: O saudoso Padre Américo e o que ele representava para os meninos da rua. Ele percorria as vielas mais sombrias e problemáticas desta cidade, ouvindo as suas tristes histórias e aventuras com um sorriso tão doce, tão terno, tão caloroso que chamando alguém da família lhes pedia, para deixarem ir consigo esses meninos. Prometia ensinar-lhes uma profissão e fazer deles uns grandes homens.
A sua ação a bem dos rapazes da rua era já bem conhecida em todo o país e era com lágrimas nos olhos, que lhes entregavam os filhos.
São do padre Américo estas palavras:
- Não há rapazes maus1...
Eles frequentavam a escola e era - lhes ensinada nas várias oficinas, da casa do gaiato as mais variadas profissões.
Um dia, um rapaz que era muito molengão disse que não ia para o campo trabalhar, pois produziam na quinta vários alimentos e todo este trabalho e o da casa estava também a cargo dos rapazes.
Eles eram autónomos. Entre si tinham regras e por isso escolhiam um chefe.
Tendo o padre Américo sabido do problema, vai ter com o rapaz molengão e ouviu-o com atenção. Pouco falou: não o repreendeu, não lhe chamou nomes, não o irritou.
Só disse:
- Está bem!...
O lanche era pão com mel das suas colmeias e uma bebida. Aquela tarde custou muito a passar ao negativista. Não tinha com quem falar, com quem brincar, não havia ainda televisão, muito menos telemóvel e sozinho, qualquer brincadeira não fazia sentido.
Todos os outros foram trabalhar. Levaram a bola, para irem chutando ao virem a caminho de casa para lanchar: pão com mel e uma bebida.
Quando o rapaz se prontificava para pegar no pão com mel, o pai Américo, como era chamado, toca-lhe no ombro, fala-lhe ao coração dizendo:
- Tu tens coragem de comer o pão que deu tanto trabalho a tanta gente, para chegar até aqui?...
Tens coragem de lhe pôr mel que deu tanto trabalho às abelhinhas?... Elas coitadinhas correram montes e vales à procura do néctar docinho das flores, para o fabricarem!...
Olha, eu não conseguia. Eu sei que para ti trabalhar é difícil, mas faz só o que fores capaz.
Eu sei que te custa e compreendo-te!...
Com a face lavada em lágrimas, o moço pede desculpa e torna-se um grande trabalhador.
Pai Américo morre num acidente de viação. O caixão vinha lacrado. E não é que foram dar com os rapazes a fazerem um buraco no mesmo para se puderem despedir e olhá-lo pela última vez, tanto era o amor que lhe tinham!...