Naquele ano de 1922 era preciso demonstrar que a pequenina Manchester lusa podia ser periférica, débil e vulnerável, mas começava a emergir das suas nuvens de vapor. Os nossos concidadãos, é certo, por vezes desesperavam. Ainda não possuíam, por exemplo, um hospital para tratar dos seus doentes pobres e desvalidos nem dispunham de uma rede de telefones com ligação ao Porto ou a Lisboa e, por conseguinte, ao resto do mundo. Mas, num indicador essencial, alguns deles começavam a não temer ninguém. A resposta, pelo menos desde há algum tempo, andava cheia de fé: as indústrias, mais indústrias, mais fábricas e oficinas com chaminés cheias de fumo e ruidosas máquinas a vapor... Eram aquelas chaminés e aquelas máquinas quem, ao longe, para que não ficassem para trás, anunciavam o progresso material e o labor incessante de quem ali tinha nascido ou, vindo das aldeias contíguas, ali produziam chapéus de pelo de coelho. Todavia, pelos vistos, bastava abrir o jornal num domingo frio de inverno, aquele fato não chegava.
Nem S. João da Madeira era Manchester, nem Portugal a Inglaterra. Com a sua pequenina e pouco concorrida estação de caminho de ferro; com as sua forças vivas, as suas associações – a dos comerciantes e industriais, a dos operários, a de socorros mútuos, a de um grémio para recreio instrutivo das suas elites pouco numerosas... -; com o seu clube de ténis; com o novo jornal; ou com os seus ativos e generosos emigrantes do outro lado do mar, S. João da Madeira era uma povoação não só pequena como irritada por se manter excessivamente dependente de quem parecia não sentir culpa por a ter manietada, esbanjando com pouca prudência o seu dinheiro e não a deixando recuperar o valor dos seus odiosos e malditos impostos.
Artigo disponível, em versão integral, na edição nº 3835 de O Regional, publicada em 18 de março de 2021.