Marques Mendes elogio Almeida Santos e Mota Amaral pelo exemplo que davam de transparência e clareza
Nos anos em que fui deputado tive o privilégio de conviver com dois excelentes Presidentes da Assembleia da República – Almeida Santos e Mota Amaral. Pertenciam a partidos diferentes mas tinham em comum ligações a duas instituições ultimamente tão faladas – Almeida Santos à Maçonaria, Mota Amaral ao Opus Dei. O mais importante mesmo é que acrescentavam a esta realidade uma outra circunstância singular: nem um nem outro faziam questão de guardar segredo das ligações que tinham àquelas duas instituições.
Eu, que nunca pertenci nem pertenço à Maçonaria ou ao Opus Dei, considero que estes dois políticos merecem elogio pelo exemplo que davam de transparência e clareza. De facto, em pleno século XXI, vivendo nós em liberdade e democracia, não faz sentido que qualquer instituição faça do secretismo o seu modo de funcionamento. Em ditadura, esta marca até podia ser compreensível. A Maçonaria, por exemplo, era perseguida e tudo fazia naturalmente para se proteger. Em democracia o segredo já não é compreensível. Ainda por cima porque este segredo é responsável, justa ou injustamente, pela generalização de suspeitas perigosas e preocupantes. A suspeita de que ser-se da Maçonaria é uma forma de mais facilmente subir na vida, nos negócios ou na carreira política. A suspeita de que a Maçonaria existe para acumular poder e exercer influência, sem escrutínio e sem transparência. Suspeitas que semeiam um lastro de especulação que contamina negativamente a sociedade e a democracia.
O problema mais sério, porém, é quando do plano associativo passamos para o plano do Estado. Ou seja, quando membros de instituições com estas características assumem também cargos políticos. Aqui, no plano do Estado, a marca só pode mesmo ser uma: a marca da transparência e do escrutínio, nunca a imagem da opacidade ou do segredo. O que está em causa neste plano não é seguir as regras de vida da Instituição; é respeitar, sim, os princípios de funcionamento do Estado. E não se tente contrariar esta exigência com a invocação do direito à reserva de vida pessoal. Este é um direito relativo e não absoluto. Ninguém é obrigado a assumir um cargo político. Mas quem faz uma opção pela vida política já sabe que o direito à privacidade cede profundamente perante o dever público do escrutínio, da transparência e do conhecimento pelos eleitores do percurso de vida daqueles que o representam. É o interesse público que leva a lei a obrigar os responsáveis políticos a exporem a sua vida financeira, os rendimentos que têm, as contas bancárias que titulam, o património que exibem. É o mesmo princípio que devia levar membros da Maçonaria ou de outras instituições com a marca do secretismo a tomarem a iniciativa de declararem voluntariamente esse seu estatuto. A democracia é isto mesmo: o regime da transparência, da publicidade e do escrutínio. Os exemplos de Almeida Santos e Mota Amaral, mais do que citados, merecem ser seguidos.