
O primeiro dilema com que me deparei ao tentar falar desta plantinha de folha acinzentada, flor lilás e perfume suave e acentuado, foi do nome: alfazema ou lavanda? Será a mesma planta? Ainda que com algumas variantes, os botânicos dizem que sim, é a mesma planta. A palavra “alfazema” provém do árabe “al-khuzâma”, enquanto “lavanda” tem origem latina, no verbo “lavare”. Como os romanos usavam a planta nos seus banhos e na sua roupa, deram-lhe o nome “lavandula”, que evoluiu para “lavand(a)” nas línguas românicas. Portugal, país privilegiado pelo cruzamento de civilizações, ficou com duas palavras para a mesma planta.
Resolvido o dilema linguístico, vamos à Botânica: pertence a uma vasta família de 29 espécies, todas semelhantes, mas com acentuadas diferenças nas caraterísticas e na utilização. Das espécies referidas, a “Lavandula angustifolia” é a mais reputada pelo seu perfume e pela qualidade dos óleos essenciais que dela se extraem. Em França, a pátria dos perfumes, a essência da lavanda, não é apenas utilizada para perfume de lavanda: ela serve de base a muitos outros perfumes, além do seu uso medicinal. É isso que justifica o deslumbramento do olhar e do olfato, quando cruzamos as enormes searas de lavanda, que povoam os campos da Provença.
Uma lenda francesa atribui o nascimento da lavanda a uma fada, a “Fada lavandula” que andava perdida pelos céus, procurando um lugar onde pudesse poisar, pois as terras que visitava eram áridas e inóspitas. Depois de muito viajar, lembrou-se das belas paisagens da Provença, mas, ao chegar, também estas tinham sido transformadas em desertos. Quando as viu, os seus olhos desfizeram-se em lágrimas e dessas lágrimas nasceram os milhares de lavandas que hoje povoam os campos provençais.
Mas também há muitas “lavandulas” em Portugal, algumas das quais na minha horta e no meu jardim. Na região de Castelo de Vide há quem as tente valorizar comercial e industrialmente. Disse-me o meu amigo Michel Henrotay, sabedor das coisas da natureza e grande amigo de Mação, que este concelho teria todas as qualidades necessárias à cultura da lavanda. Falta começar…
Planta tão bonita e tão cheirosa também não podia faltar na pena dos poetas, seres particularmente tocados pelas mensagens que os sentidos sugerem à sensibilidade. Lembram-se da “Menina de olhar sereno…”? Sim, aquela a que Ary dos Santos deu vida numa belíssima canção, imortalizada pela voz de Tonicha. No fresco retrato daquela “Menina”, não falta a “alfazema sem canteiro”. Homem de Liberdade, Ary não a quis confinada ao canteiro dos caprichos humanos…
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