A Feira dos Quatro, como a maior parte das feiras, é um fenómeno de magia.
Da madrugada para a manhã, largos e ruas, anteriormente desertos, enchem-se de tendas, bancas e rulotes, oferecendo ao mundo quase tudo aquilo de que o mundo precisa para viver. É como se um hipermercado fantasma pousasse suavemente sobre a vila e se estendesse por ali fora.
Há duas semanas, fui à Feira dos Quatro, matar saudades. Foi lá que, em tempos, adquiri um limoeiro que, ainda hoje me abastece a casa. Desta vez, ia com a intenção de comprar cebolo. Para os menos instruídos em termos agrícolas, explique-se que o cebolo não é o marido da cebola. O cebolo é o nome da cebola enquanto jovem, assim uma espécie de bebé-cebola, que depois se transplanta para a morada definitiva, para crescer e engordar.
Subi então pela Feira dos Quatro, na vizinha vila de Arrifana. Atravessei a zona de vestuário e calçado e cheguei ao meu destino: tendas de alfaias agrícolas, bancas de legumes, fruta, bolbos, azeitona, bacalhau, uma variedade de produtos a lembrar um bazar das arábias ou um centro comercial ao ar livre. Só não encontrei políticos, porque estamos em época de seca eleitoral. E também não vi cebolo. Perguntei, então, a um vendedor de robustas enxadas, mas o homem pôs um sorriso simpático, assim a modos de quem me queria vender uma enxada, e explicou-me. “Isso costuma ser ali ao lado das Alminhas, mas não sei se estará lá alguém”. Passei em frente ao monumento aos Mártires de Arrifana e dirigi-me ao pequeno nicho das “Alminhas dos fuzilados”. Só havia uma vendedeira e já a desmontar a banca. “Cebolo? Já vendi tudo! Apodreceu muito, com os dois meses de chuva. Agora, só daqui a um mês.” Contingências da meteorologia... Em março, o dia 4 calha, de novo, a um sábado. Se ainda for tempo de cebolo, lá estarei, caso contrário, acabarei por encontrá-lo nalguma das muitas feiras e mercados que se realizam na região.
Hoje, não sabemos qual o peso económico das feiras tradicionais, sobretudo na sua vertente agrícola, mas sabemos que elas persistem na resistência aos modernos meios de comércio. Num tempo em que as populações urbanas estão cada vez mais sensibilizadas para as questões da ecologia e do combate às alterações climáticas, as feiras podem ser mais um meio de resistência à “hipermercadização”.
Por isso, sempre que puder, vá às feiras, às verdadeiras, às que não fazem parte do calendário turístico, às que vendem cebolo e enxadas, herdeiras autênticas de uma tradição que, em Portugal, se iniciou em 1229.