Opinião

Hortalices - A horta de García de Orta

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O nome de Garcia da Orta aparece hoje mais referido a propósito de urgências de hospital, do que lembrando o extraordinário homem que foi. Sendo esta uma coluna tendencialmente hortícola, ficaria mal que o seu nome não fosse aqui lembrado, apesar de faltar um “h” no Orta de Garcia. Além da homofonia dos nomes, há um motivo bem maior para lhe dedicar estas linhas. Garcia de Orta foi um pioneiro da ciência botânica moderna. E haveria ainda outras razões para falar dele: o facto de a sua família ter sido alvo de intolerâncias religiosas e o de ter dado a palavra ao seu amigo Luís de Camões. Mas, hoje, fiquemo-nos pelo botânico e de forma muito resumida, porque a sua vida e a sua obra encheriam muitas páginas de jornal.
Oriundo de famílias de cristãos-novos, nasceu em Castelo de Vide, estudou Medicina em universidades castelhanas, prestou provas perante as autoridades médicas e obteve autorização para “praticar medicina” e “andar de mula”, porque lhe seria difícil manter um cavalo, meio de transporte obrigatório para os funcionários régios.
Em 1534, Garcia de Orta embarca para a Índia como “physico” (médico) do seu grande amigo e protetor Martim Afonso de Sousa. É em Goa que vive, investiga e pratica medicina, durante cerca de 30 anos, até à sua morte, por volta de 1568. O seu aturado estudo da botânica local fica plasmado na obra “Colóquios dos simples e drogas he cousas medicinais da Índia”. Essa obra, em forma de diálogo, dá conta dos nomes e características das plantas, os “simples”, e dos compostos que delas resultavam, as “drogas”.
As especiarias eram comummente conhecidas na Europa pelo seu aroma e pelo seu sabor e talvez por algumas qualidades terapêuticas, mas pouco se sabia das plantas que lhes davam origem. Ao longo dos 59 colóquios dessa obra, são descritos, aprofundadamente, mais de cinquenta plantas e minerais e respetivas propriedades terapêuticas.
Voltando à horta, Garcia de Orta tinha, de facto, uma horta. Além da mesa de trabalho onde ia observando e classificando plantas e minerais, a sua casa tinha um quintal, onde fazia sementeiras e plantações do que lhe parecia interessante. E hoje, em vez de uma horta, Garcia de Orta tem dois jardins com o seu nome: um em Pangim, Goa, e outro no Parque das Nações, em Lisboa. Não terá sido em nenhum deles que Inquisição espalhou o pó dos seus ossos, exumados e queimados em auto de fé, doze anos após a sua morte. Dizem que a cinza é boa para as plantas, mas o que fez crescer e multiplicar muitas plantas foi a persistência, a dedicação e o estudo do maior botânico português de todos os tempos.

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