O momento alto da visita de 1909 foi a homenagem ao comendador António Dias Garcia e ao Visconde de S. João da Madeira, prestada pela “Junta da Parochia”, no primeiro domingo de novembro. A sessão solene realizou-se no interior da igreja matriz. De acordo com o jornal “A Opinião”, de 11 de novembro de 1909, “a concorrencia era enorme e selecta, vendo-se ali o que de mais distincto havia na primeira sociedade sanjoanense”.
Na sacristia do templo, o padre António Joaquim de Oliveira lembrou as qualidades e virtudes dos dois beneméritos, em honra dos quais se celebrava ali aquela homenagem de gratidão e reconhecimento. Usaram ainda da palavra António José de Oliveira Júnior, enquanto vereador da câmara de Oliveira de Azeméis, e o “par do reino”, Ernesto Pinto Basto. Antes de encerrada a sessão, os homenageados “em phrases curtas, mas muito expressivas, agradeceram a manifestação com que os sanjoanenses acabavam de os honrar”.
Nos anos que se seguiram, António Dias Garcia repartiu a sua vida entre a pátria natural e a pátria adotiva, o Brasil. Numa primeira fase, esteve menos presente no seu torrão natal, poupando, assim, sua esposa e as três filhas de tenra idade às dolorosas travessias do Atlântico. Um navio a vapor, à época, demorava, em média, 35 a 40 dias, tanto na viagem de vinda como na de ida. Uma eternidade!
Por outro lado, Portugal vivia um período marcado por grande instabilidade política e social, resultante da implantação da República, em outubro de 1910.
A família Dias Garcia só voltaria a pisar território luso em 1923, um ano cheio de acontecimentos marcantes para S. João da Madeira. De todos eles, a inauguração do “nosso Hospital”, a 1 de janeiro, foi, sem qualquer sombra de dúvida, o mais significativo. Ao anunciar a vinda dos ilustres filhos da terra, “O Regional”, na sua edição número 36, refere, a dado passo: “Sabemos nós e hoje queremos que saiba S. João da Madeira inteiro que Dias Garcia abandonou dias consecutivos os seus negocios e a sua casa para se entregar á faina, sempre espinhosa e absorvente, de angariar recursos para a Santa Casa da Misericórdia de S. João da Madeira”. Contudo, o povo sanjoanense não ia poder exprimir a sua gratidão com o alvoroço com que, geralmente, recebia o grande benemérito. A morte do Visconde, a 29 de janeiro desse ano, deixara a família mergulhada em luto profundo. Era a sombra que iria ofuscar o júbilo do momento.
O comendador e a esposa chegaram a S. João da Madeira no final do mês de maio de 1923. Com eles, vinham as filhas do casal, Maria Antónia, Carolina Luísa, Madalena Aurora e, também, os filhos do primeiro casamento, Manuel Correia Dias Garcia (Nelito) e Luísa Correia Garcia Dale, acompanhada pelo marido, Guilherme Dale. Durante os 5 meses que se demoraram cá, viveram recolhidos na pacatez do palacete de Carquejido, de onde saíram apenas para curtos passeios, para uma estadia de 8 dias em Entre-os-Rios e outra de duas semanas, em Espinho. Sempre com a discrição que as circunstâncias impunham, mesmo quando realizavam ações de benemerência – e foram muitas! – ou até mesmo quando a Associação Desportiva de S. João da Madeira conquistou a “Taça La-Salette”, vencendo a U. D. Oliveirense por 5-0, num jogo memorável, em que Nelito teve ação preponderante, bem como seus primos, José e Luís Garcia.
Antes do regresso da família ao Rio de Janeiro, o comendador recebeu em sua casa, no dia 4 de novembro, uma comissão composta por membros do Grupo Patriótico Sanjoanense (G.P.S.), Mesa do Hospital e Junta de Freguesia, tendo como porta-voz o dr. Renato Araújo, que foi cumprimentá-lo e agradecer todos os valiosos benefícios que vinha prestando à sua terra. António Dias Garcia agradeceu a amável lembrança e prometeu estar sempre ao lado de tudo que contribuísse para o bem e engrandecimento de S. João da Madeira.
Em terras de Vera Cruz, o comendador retoma as rédeas da casa comercial “Dias Garcia & C.ª”, a quem alguém chamou um dia “fonte de ouro bendito!”. A empresa desenvolveu-se prodigiosamente, a ponto de se ter tornado um dos maiores centros comerciais do Brasil. Esta transformação passou pela construção de um enorme edifício apropriado aos fins pretendidos, na Rua Visconde Inhaúma, no qual ficou sediada a “Sociedade Cobrazil”, fundada em 1917, que subsiste sob o patrocínio da mesma firma “Dias Garcia & C.ª”. A breve trecho, a empresa torna-se fornecedora do Governo Federal, responsável pela construção de estradas, linhas férreas e toda a espécie de construções, incluindo portos. Para além disso, fornece ao Governo Brasileiro material de guerra, importa aviões e tem uma fábrica privativa para preparação de várias qualidades de dinamite. Com as suas transações, a empresa sustenta cerca de duas centenas de colaboradores, com suprimentos corporativos.
De facto, uma “fonte de ouro” que, mais do que o fascínio material que lhe está adstrito, “gera o bem, o amor, alimenta o espírito e forma caracteres”.
(Continua)