Opinião

É a austeridade

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Sou dos que defendem que o Governo andou bem quando apresentou uma proposta de Orçamento do Estado prevendo uma nova redução do deficit orçamental para 0,9% do PIB. Tudo o que seja aproximar as despesas das receitas é positivo. Seria ainda melhor se as receitas fossem superiores às despesas.
Só devem aceitar-se deficits orçamentais em períodos excepcionais de crise ou recessão económica, para garantir que os vencimentos dos funcionários públicos e as reformas e pensões não sejam cortados. Tendo Portugal uma das maiores dívidas do mundo, não seria correcto aumentar a dívida pública. Em 2023, apesar de a dívida aumentar em termos nominais, a sua relação face ao PIB diminui muito significativamente, à custa do imposto inflacionário.
Retirar Portugal do radar dos países mais endividados é uma opção muito positiva do primeiro-ministro. Para o conseguir, o Governo teve que aumentar as reformas abaixo do valor legalmente previsto, provocando um corte nas pensões que atinge o valor de 1.000 milhões de euros em cada ano a partir de 2024. E teve também que aumentar os vencimentos da função pública abaixo do valor da inflação de 2022 e da inflação esperada para 2023. Pensionistas e funcionários públicos vão perder poder de compra. Vão poder comprar menos no supermercado, apesar de os vencimentos e pensões subirem nominalmente.
O que não se percebe é a dificuldade do Governo em reconhecer esse corte do poder de compra. As famílias portuguesas vão passar a ter uma vida mais austera, ou seja, vai haver austeridade.
Houve austeridade no Governo de Passos Coelho quando houve cortes que obrigaram os portugueses a comprar apenas 950 gramas de carne, quando antes compravam um quilo. E há austeridade no Governo de António Costa porque muitos portugueses vão poder comprar as mesmas 950 gramas, em vez de um quilo, porque os rendimentos vão subir 5%, mas o preço da carne sobe 10%. O que define o poder de compra é o que o dinheiro permite comprar e não a quantidade de notas que se tem na carteira. Não há qualquer dúvida que em 2023 os funcionários públicos e os reformados vão levar para casa menos compras do supermercado.
Ficaria bem ao Governo defender as contas certas, mas também assumir que os portugueses estão a perder poder de compra. É a austeridade.
O problema é que o Governo passou os últimos anos a afirmar que a austeridade do tempo de Passos Coelho tinha sido uma opção, uma escolha e uma vontade do Governo e não uma imposição da troika e das suas circunstâncias. Como se algum político impusesse austeridade aos seus eleitores por capricho ou malvadez.
No Governo de Passos Coelho houve austeridade porque a troika a isso obrigou para colocar as contas públicas em ordem; no Governo de António Costa está a haver austeridade porque a isso obriga a opção do Governo pelas contas públicas em ordem.

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