Quando falamos em Viena de Áustria, as primeiras ideias que nos ocorrem têm a ver com música, com ópera, com palácios, com Schönbrunn, onde uma vez vi uma Sissi televisiva, de carne e osso, a desfolhar pétalas numa varanda. Schönbrunn tem uma bela fachada, uma bela alameda, um belo jardim, um belo lago. Tudo ali é belo, ainda que muito despojado de miolo. E não tem uma horta, como Versalhes, nem os carrilhões de Mafra.
Mas deixemos Schönbrunn e viajemos até um bairro de Viena, chamado Hundertwasserhaus. Como muitos outros nomes da língua alemã, este divide-se em três palavras “hundert”+ “Wasser”+ “Haus”, o que, traduzido palavra a palavra, daria “cem”+ “água”+ “casa”. Com um pouco de boa vontade poderia significar “casa das cem águas”. Mas não é bem assim. Comecemos pelas casas.
Mas há outra inovação na arquitetura de Hundertwasser: às linhas curvas de Gaudi acrescentou um elemento muito importante: as plantas e a natureza. Segundo ele, a arquitetura afastou-se dramaticamente do homem e da natureza e é necessário fazer uma reaproximação.
As casas do bairro por ele planeado mal se distinguem de florestas verticais. Há plantas em todas as posições: umas debruçam-se do telhado, outras espreitam pelas janelas e há ainda as que deslizam pelas paredes em dificultosos exercícios acrobáticos. Mesmo sem ver o telhado, sabemos que a telha preferida dele é o relvado.
Não sei se as casas do senhor Hundertwasser resistem a infiltrações, fendas nas paredes, humidade, mas é natural que não. O inventor das casas-floresta publicou, em 1958, o “Manifesto do bolor”, no qual defendia que “cada habitante deveria cultivar o seu próprio bolor doméstico”, porque “o homem deve participar no ciclo orgânico como um ser biológico”. Em tempos de radicalidade na defesa de valores ambientais, aí está uma forma de combater a tendência do homem moderno para se distanciar progressivamente da natureza. Se é essa a via, não sei. Mas é verdade que alguma coisa tem que ser feita.