Luís Filipe Guerra: “Creio que as crónicas têm um formato adequado para serem lidas de diferentes formas”
A obra é a estreia de Luís Filipe Guerra na literatura, que pretende lançar “um olhar esperançoso para o futuro”, já que muitas das temáticas abordadas no livro estão ainda presentes e “continuarão a fazer parte da nossa existência futura”.
Jornal ‘O Regional' “Crónicas Transmontanas” vai ser apresentado pela primeira vez aos sanjoanenses na Biblioteca Municipal Renato Araújo. Sendo um filho da terra sente que a responsabilidade é maior do que noutras cidades?
Luís Filipe Guerra – De certo modo, sim. A situação faz-me lembrar daqueles adágios populares que afirmam que “ninguém é profeta na sua terra” e que “os santos da casa não fazem milagres”, mas também é verdade que estarei, certamente, rodeado de amigos e familiares e que isso traz um suplemento de calor humano que contrabalança essa responsabilidade. De resto, tratando-se de um livro que não incide, diretamente, sobre a realidade local sanjoanense, fico mais à vontade para expor as minhas observações e reflexões que, partindo, muitas delas, da paisagem social e natural transmontana, acabam por tocar temáticas mais gerais. Por isso, faz sentido dá-las a conhecer aos meus conterrâneos, sendo também uma forma de expressar a minha gratidão pelas vivências associadas a esta cidade.
Este livro foi escrito entre fevereiro de 2012 e janeiro de 2023, período durante o qual trabalhou na cidade transmontana de Mirandela, na sequência da sua colocação como juiz no tribunal da região. Que importância teve esta sua passagem por esta região e onde foi buscar a inspiração para as crónicas que escrevia na imprensa local?
Para quem, como é o meu caso, provém do litoral, é sempre importante a imersão no denominado “Portugal profundo”, porque nos mostra outra face do país. Não me coloco na perspetiva arrogante de quem considera o interior uma zona atrasada, mas são evidentes as assimetrias regionais, no que diz respeito a densidade demográfica, envelhecimento populacional, atividades económicas prevalecentes, práticas sociais, etc. Além disso, no que respeita às problemáticas jurídicas com que sou confrontado, no âmbito da jurisdição administrativa, há também alguma especificidade, em função da realidade social e económica regional. Desse ponto de vista, o contacto com a realidade transmontana tem sido muito enriquecedor.
Por outro lado, o tempo – e não me refiro ao clima (que é outro assunto) – é diferente nas povoações mais pequenas: menos acelerado, menos saturado de estímulos, e isso, nas doses certas, acaba por ser gratificante, porque oferece espaço à contemplação e à reflexão. Nesse sentido, a passagem pela região transmontana, onde ainda me mantenho, também abriu a porta à escrita e, dessa forma, à edição deste livro.
E quanto à inspiração?
Essa é a mais complicado de explicar.
Nem sempre é claro se ela vem de fora para dentro, isto é, da paisagem externa (pessoas, lugares e situações) para a minha mente, despertando uma cadeia de emoções e ideias, que se expressam na escrita, ou se, ao invés, surge primeiramente no meu interior para se projetar sobre os elementos da paisagem externa, cobrindo-a de significados. Suponho que haverá um entrecruzamento de ambos os movimentos, centrípeto e centrífugo, e que isso permite realimentar o processo criativo. Pelo menos foi isso que senti e creio que isso se reflete nas crónicas que escrevi.
Em todo o caso, posso dizer que o impulso inicial de escrever surgiu de uma situação de encerramento, provocada pelos sucessivos confinamentos no quadro da prevenção e combate à Covid-19, e da correspondente necessidade de comunicar com outros, mas também de um afã de contribuir, de algum modo, para o progresso da região e das suas gentes mediante a partilha de ideias e experiências, para mim significativas, na imprensa regional.
Poderá ter acesso à versão integral deste artigo na edição impressa n.º 3972, de 25 de janeiro de 2024 ou no formato digital, subscrevendo a assinatura em https://oregional.pt/assinaturas/