Sociedade

“Não concentrar as decisões nem em profissionais políticos nem em cientistas profissionais”

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A investigadora Stella Azevedo alertou para o facto da sociedade civil não estar a acompanhar as experiências que estão a ser feitas internacionalmente.

O ensaio “Bioética da Finitude”, apresentado este mês na biblioteca municipal de S. João da Madeira, é uma adaptação da tese de doutoramento de Stella Zita Azevedo.
A autora começa por alertar que “há uma confusão corrente entre bioética e ética biomédica”, esclarecendo que “a bioética é de carater filosófico, porque reflete sobre os fundamentos e princípios sobre os quais a ética biomédica se inspira”. Assim, “todos os procedimentos da ética médica assentam ou partem da reflexão sobre fundamentos de natureza filosófica”.
A pedido d’O Regional, Stella Azevedo define o conceito de bioética como sendo a “área da filosofia que estuda ou reflete sobre todos os problemas que contemporaneamente se levantam de natureza biotecnológica, biomédica, bioneurotecnológica, e que põe em causa toda a vida e futuro de vida à escala planetária”, ou seja, “não reflete só sobre o ser humano, já se pensa a nível planetário”. Trata-se de um conceito que surgiu nos Estados Unidos da América, nos anos 70, e que “foi sendo apropriada por teóricos norte americanos, consoante as áreas em que foi aplicada”.
A obra, cujo título parte de um conceito proposto pela autora, procura assim apresentar uma fronteira entre os conceitos, com Stella Azevedo a frisar, desde logo, que as suas reflexões são de natureza filosófica.
Além disso, a autora considera que “o comum dos mortais não tem acompanhado o debate bastante feroz que está a acontecer em certas elites, entre humanismos, transumanismos e pós humanismos”.
Como explica, há uma corrente ideológica que está a influenciar “toda a investigação biotecnológica a nível internacional, na defesa do transumanismo”, ou seja, “extinção do ser humano tal como o conhecemos”.
No seguimento, no livro, a autora também faz considerações sobre “esse totalitarismo”, conforme carateriza.

“Não há nenhum ser vivo mais frágil que o ser humano”

“Os debates a nível bioético estão reservados a uma elite, a comités de ética, a uma elite política e o desfasamento da população e sociedades civis é cada vez maior”, aponta Stella Azevedo, que procura desconstruir alguns mitos, como o de que em filosofia não há soluções.
“Já estamos a afastar-nos muito da ideia da ciência moderna de que o conhecimento científico é igual a verdade e objetividade”, considera igualmente, crendo que “a ciência, com a evolução que teve, está muito mais próxima da filosofia do que ao contrário”. Nesse sentido, assegura que “há conclusões e soluções”.
Lembrando o “ideal que a ciência sempre teve de escapar à mortalidade, finitude e temporalidade (condição intrínseca do ser humano)”, Stella Azevedo sublinha que “não há nenhum ser vivo mais frágil que o ser humano” e fala de testes e simulações que estão a ser feitos sem o conhecimento das populações.
Por exemplo, o “exosqueleto - esqueleto que aguenta todo o tipo de peso - já existe”. Além disso, há, segundo aponta, experiências a nível neuroquímico e neuroelétrico que permitem “comandar à distância o pensamento”. Seguindo o exemplo de Stella Azevedo, isto significa que o pensamento de um rato dos Estados Unidos da América pode comandar um rato noutro lado do mundo que, por sua vez, executa um movimento enviado pelo primeiro.
“Há imensas experiências que estão a ser feitas, que permitem tornar as sociedades atuais, de natureza democrática, em novos totalitarismos”, alerta, completando que “a informática, as neuroengenharias, as biotecnologias visam o controlo total da mente através de dispositivos informáticos e tecnológicos”, “retirando a liberdade ao ser humano”, podendo mesmo refazer a memória, conforme sustenta a investigadora.
Assim, no ensaio publicado, Stella Azevedo chama a atenção para o conjunto de problemas a nível “político, biopolítico, social, económico, ético que o novo paradigma bioético ameaça (ou virá a ameaçar) uma extinção do ser humano tal como o conhecemos e, até lá, agravar o fosso entre ricos e pobres, entre poder e saber”.
A solução passa, no seu entender, por alertar os jovens que as ciências não são neutras e vivem de valores. A sua proposta é “restaurar, defender a autonomia do indivíduo, a liberdade, a soberania do sujeito, defendendo-o desses novos totalitarismos”, que podem ser veiculados por empresas, ciência, redes sociais, que exercem influência naquilo que cada pessoa é e onde está.

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